E eu não tinha palavras para compartilhar
com ninguém.
As barreiras da linguagem, eu amaldiçoei silenciosamente,
E todos os diferentes nomes para a mesma
coisa!”
[Death Cab for Cutie]
A umidade
salgada encheu suas narinas. O som das ondas batendo nas pedras compunha a
canção que a Lua, apesar de sua majestosa pose de artista, nunca começava a
cantar. Por timidez ou respeito.
Levou a mão
aos cabelos maltratados pelo sal e pela areia. Eram longos, lisos e pretos.
Ainda estavam molhados, do rápido mergulho de instantes atrás. Quisera que
aquelas águas tão poéticas fossem capaz de libertá-lo. Pura ilusão. A Natureza
era bela sim e a paisagem, de fato, descansava seus olhos. Mas a sua alma permanecia
inquieta.
A noite
parecia adensar-se em uma velocidade anormal. Quase não via mais os próprios
pés. Caminhava lentamente sobre as pedras escorregadias, evitando o lodo e as
irregularidades da superfície.
Precisava
daquele breve tempo sozinho, mas não queria (e nem tinha o direito de)
prolongá-lo. Ali, mais adiante, estavam algumas das pessoas que mais amava no
mundo: não queria causar qualquer tipo de constrangimento com os seus sumiços e
desânimos.
Quando seus
pés tocaram a areia e as pedras deixaram de impedir a vista do horizonte,
enxergou a fogueira e a silhueta das barracas. Ninguém estava só. Ouvia risos e
diálogos eufóricos. Naquele preciso momento, em que os amigos ainda não haviam
notado sua ausência, ele não era necessário. Aproximou-se devagar. Trazia, nas
mãos, a camiseta e os chinelos.
– Onde você
estava? – indagou o amigo, conservando o sorriso que surgira da conversa com a
moça ao seu lado. O olhar, entretanto, era sério e penetrante.
– Fui só
dar uma volta... – respondeu, cabisbaixo. Em seguida, tentou disfarçar o humor,
com um sorriso improvisado. – Aproveitar o mar...
O amigo
movimentou a cabeça, em compreensão. A moça ao seu lado parecia ofendida pela
interrupção. Acalmou-se, entretanto, quando obteve novamente a atenção do moço.
Mais à
frente, próximo à fogueira, dois outros amigos discutiam Filosofia. Mas, é
claro, não sabiam que a discussão tinha esse nome. Preferiam apelidos como
Destino, Deus, Alma e Tempo.
Das
barracas, emergiam risos e reclamações. Uma das meninas imitava a professora de
Cálculo. Depois dos risos e aplausos, começava uma nova imitação.
Lembrou-se
de quando aquele grupo era muito maior. Tiraram uma foto com incontáveis rostos
felizes. Aos poucos, alguns rostos foram mudando. Outros, simplesmente saíram.
Os remanescentes pareciam felizes, ainda. Mas quando, numa festa, um
desconhecido se propôs a tirar uma foto, alguém (todos e nenhum) respondeu:
– Não adianta
tirar uma foto. Já passou.
Limitou-se
a agarrar uma garrafa de cerveja vazia e deitar em seu colchonete. O suposto
sono evitaria que notassem sua tristeza. A garrafa vazia justificaria o sono. Tudo
muito bem arquitetado para pensar no que o entristecia, sem entristecer mais
ninguém.
De olhos
fechados, enumerou tudo o que a claridade o impedia de ver. E ah, eram tantos
nomes diferentes para a mesma coisa! Sentia medo, angústia, ciúmes, cheiro de
sal, dor de cabeça, perfume, prazer e, é claro, amor. Ele sentia o mundo. Tão
amplo, tão intenso. E tudo aquilo era indissociável.
O que fazer
quando, há anos, não se consegue mais chorar? Soltar um grito que incomode,
quando nem ao menos se sabe se quer ser incomodado? Isolar-se e caminhar
sozinho na praia, no bosque ou na cidade? Em qualquer parte, ainda estaria em si. E isso não podia ser evitado.
Ah, como eu fugi de mim...! Mas, agora, não adianta mais
correr ou andar sozinho. Cheguei ao meu centro: a partir daqui, todas as
distâncias são iguais, todos os nomes são para a mesma coisa. O centro não é
exclusivamente ruim. Aqui eu me entendo. E entendo que é preciso entender os
outros. E me enganar, sempre. Para compor a sucessão de enganos que culmina, há
de culminar, em uma risada. Ser feliz é uma questão de opinião.
Em meio a
tantos pensamentos, e devido aos olhos fechados, não notou a sombra estranha
que a fogueira projetara na barraca. Foi uma passagem rápida; durou segundos.
Mesmo que tivesse visto, teria dificuldades em acreditar no que vira. Talvez,
chamasse de vulto. Ou culpasse a cerveja que não bebeu. Quando enfim se deu
conta do que estava acontecendo, não conseguiu se mover. Paralisou-se de
choque. Tudo o que fez foi contemplar os gritos de dor e desespero que vinham
de fora, ainda de olhos fechados.
- A propósito, hoje faz 6 anos desde a minha primeira publicação em um blog. E, mesmo desleixados, ainda existimos. Parabéns pra nós! =)
2 comentários:
Was it just a dream? xD
Você escrevem muito bem, e admiro muito isso.
Quem dera eu poder um dia escrever com tanta maestria... =)
Ah, e parabéns pelo blog! ^^
Me identifiquei muito.
Em pensar que encontrei este texto ao procurar por tautologia. rs
Se posso me intrometer, eu acharia o texto perfeito sem o último parágrafo. Ele é desnecessário =)
Abraços!
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