"Cérebros
brilhantes também podem produzir grandes sofrimentos.
É preciso educar os corações."
É preciso educar os corações."
[Dalai
Lama]
Aquela era
a hora em que Morfeu, o deus do sono, estaria gentilmente forçando as pálpebras
das pessoas, a fim de fechá-las. Era mais fácil se agarrar a uma mitologia tão
antiga como explicação provisória, do que assumir a própria irresponsabilidade
para com os ritmos circadianos.
O balanço ritmado
do ônibus e a escuridão generalizada pareciam facilitar o trabalho do suposto
deus. De um lado, alguns carros passavam ligeiros, incidindo a luz dos faróis
nos passageiros do ônibus. Do outro lado, a paisagem permanecia constante a
maior parte do tempo, variando apenas em densidade de vegetação e possibilidade
de visualização do céu, já sem estrelas.
Mas nem
todos dormiam. Um bravo guerreiro lutava contra a vontade sobre-humana; se
vestindo dos escudos, armas e armaduras da consciência. O fluxo de pensamentos
o mantinha acordado, como a água corrente mantém um rio.
Lembrava-se
do que viveu. De como a sua vida tinha mudado, em tão pouco tempo. De como
havia se permitido. Se entregado, até.
Durante
algum tempo, orgulhou-se de dispor de um infinito particular, o desvão recatado
do cérebro, o impenetrável espaço-tempo de sua consciência. Um lugar livre de
preconceitos e intrusos. Tão só, tão seu. Mas que, agora, recebia mais alguém.
Não sabia o
que era aquilo. Se o eterno fogo que arde sem se ver ou a efêmera chama infinita
enquanto dura. Não queria dinheiro, posses, sexo desmedido, nem elogios da
sociedade. Apenas a simplicidade e a beleza de estar junto.
Então, Morfeu
agiu com mais força; mas o guerreiro resistiu, ainda. Lembrou, então, das
impossibilidades práticas e do terceiro elemento. Da necessidade humana de
complicar e, ainda assim, se dizer simples. O inferno são os outros. My body is a cage.
Sentiu o
tão conhecido e desagradável aperto no coração. Como alguém de quem gostava muito,
podia ser a fonte de tanto sofrimento? A montanha-russa de sentimentos era
extensa; mas, como tudo na vida, tinha fim. Assim que o carrinho parasse, seria
escolha sua: abandonar ou permanecer?
Foi quando
o rio parou. Com o impacto, o fluxo de pensamentos cessou. O céu veio abaixo. O
silêncio reinou absoluto. Morfeu e Tânatos venceram.
3 comentários:
My body is a cage
That keeps me from dancing with the one I love
But my mind holds the key...
Vinícius, gosto muito de ler seus textos... Admiro como você tem "intimidade" com as palavras. Gostaria conhecer seu livro, onde posso encontra-lo?
Oi, Isabel! Muito obrigado por ler os textos! Quanto ao livro, eu posso enviar um pra você. É só passar seu endereço por aqui: rodovalhovr@yahoo.com. Abraço!
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