A máfia bósnia
o perseguia. Crianças sem nomes não desviavam o olhar de sua janela. Tudo o que
podia fazer era apreciar a beleza dos raios de sol que entravam sorrateiramente
e iam tocar o chão. A água chegava suja, a energia fora cortada, os suprimentos
quase acabavam. Apesar de tudo, restava a internet. Postava fotos antigas, de
amigos, mulheres e bebidas, fingindo que eram de então. A internet o mantinha
vivo. Privado de todo o resto, não podia abdicar a verdadeira extensão da alma
humana.
As crianças
sem nome, às vezes, jogavam pedras. Quase agradecia por, enfim, poder sentir
algum tipo de movimento. Mas jamais chegaria perto da janela e dos raios. A
máfia bósnia o perseguia e as crianças sem nome tinham fuzis.
Postou
outra foto. Recebeu comentários e aprovações. Cultivou toda a superficialidade
de que tinha direito. Fora dali, não havia vida. Apenas os raios solares, as
crianças bósnias e a máfia sem nome. Tinha uma pedra pela janela. E a
escuridão. Os raios solares se foram?
Barulho. As
crianças bósnias gritavam seus nomes? Não podia ter certeza, pois a janela
escura sem raios solares era inalcançável. Na internet, a notícia de que a
máfia bósnia fora encontrada morta no parque. Seria seguro se levantar?
Num momento
de euforia, correu até a janela. Olhou em volta, para cima e para baixo. Viu
nuvens pesadas de chuva, cobrindo os raios solares. Viu os prédios vizinhos,
cobrindo o horizonte. Viu milhares de janelas, enfeitando os prédios. Dentro
delas, viu milhares de computadores, cobrindo os corações. E quando achou que
fosse ver um coração descoberto, sentiu uma pedrada na testa.
Uma criança
bósnia gritou um nome.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Rebusque sua opinião.