sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Além da janela

A máfia bósnia o perseguia. Crianças sem nomes não desviavam o olhar de sua janela. Tudo o que podia fazer era apreciar a beleza dos raios de sol que entravam sorrateiramente e iam tocar o chão. A água chegava suja, a energia fora cortada, os suprimentos quase acabavam. Apesar de tudo, restava a internet. Postava fotos antigas, de amigos, mulheres e bebidas, fingindo que eram de então. A internet o mantinha vivo. Privado de todo o resto, não podia abdicar a verdadeira extensão da alma humana.
As crianças sem nome, às vezes, jogavam pedras. Quase agradecia por, enfim, poder sentir algum tipo de movimento. Mas jamais chegaria perto da janela e dos raios. A máfia bósnia o perseguia e as crianças sem nome tinham fuzis.
Postou outra foto. Recebeu comentários e aprovações. Cultivou toda a superficialidade de que tinha direito. Fora dali, não havia vida. Apenas os raios solares, as crianças bósnias e a máfia sem nome. Tinha uma pedra pela janela. E a escuridão. Os raios solares se foram?
Barulho. As crianças bósnias gritavam seus nomes? Não podia ter certeza, pois a janela escura sem raios solares era inalcançável. Na internet, a notícia de que a máfia bósnia fora encontrada morta no parque. Seria seguro se levantar?
Num momento de euforia, correu até a janela. Olhou em volta, para cima e para baixo. Viu nuvens pesadas de chuva, cobrindo os raios solares. Viu os prédios vizinhos, cobrindo o horizonte. Viu milhares de janelas, enfeitando os prédios. Dentro delas, viu milhares de computadores, cobrindo os corações. E quando achou que fosse ver um coração descoberto, sentiu uma pedrada na testa.
Uma criança bósnia gritou um nome. 

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