segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Diferentes nomes para a mesma coisa

“O litoral desapareceu quando o mar afogou o Sol
E eu não tinha palavras para compartilhar com ninguém.
As barreiras da linguagem, eu amaldiçoei silenciosamente,
E todos os diferentes nomes para a mesma coisa!”
 [Death Cab for Cutie]

A umidade salgada encheu suas narinas. O som das ondas batendo nas pedras compunha a canção que a Lua, apesar de sua majestosa pose de artista, nunca começava a cantar. Por timidez ou respeito.

Levou a mão aos cabelos maltratados pelo sal e pela areia. Eram longos, lisos e pretos. Ainda estavam molhados, do rápido mergulho de instantes atrás. Quisera que aquelas águas tão poéticas fossem capaz de libertá-lo. Pura ilusão. A Natureza era bela sim e a paisagem, de fato, descansava seus olhos. Mas a sua alma permanecia inquieta.

A noite parecia adensar-se em uma velocidade anormal. Quase não via mais os próprios pés. Caminhava lentamente sobre as pedras escorregadias, evitando o lodo e as irregularidades da superfície.

Precisava daquele breve tempo sozinho, mas não queria (e nem tinha o direito de) prolongá-lo. Ali, mais adiante, estavam algumas das pessoas que mais amava no mundo: não queria causar qualquer tipo de constrangimento com os seus sumiços e desânimos.

Quando seus pés tocaram a areia e as pedras deixaram de impedir a vista do horizonte, enxergou a fogueira e a silhueta das barracas. Ninguém estava só. Ouvia risos e diálogos eufóricos. Naquele preciso momento, em que os amigos ainda não haviam notado sua ausência, ele não era necessário. Aproximou-se devagar. Trazia, nas mãos, a camiseta e os chinelos.

– Onde você estava? – indagou o amigo, conservando o sorriso que surgira da conversa com a moça ao seu lado. O olhar, entretanto, era sério e penetrante.

– Fui só dar uma volta... – respondeu, cabisbaixo. Em seguida, tentou disfarçar o humor, com um sorriso improvisado. – Aproveitar o mar...

O amigo movimentou a cabeça, em compreensão. A moça ao seu lado parecia ofendida pela interrupção. Acalmou-se, entretanto, quando obteve novamente a atenção do moço.

Mais à frente, próximo à fogueira, dois outros amigos discutiam Filosofia. Mas, é claro, não sabiam que a discussão tinha esse nome. Preferiam apelidos como Destino, Deus, Alma e Tempo.

Das barracas, emergiam risos e reclamações. Uma das meninas imitava a professora de Cálculo. Depois dos risos e aplausos, começava uma nova imitação.

Lembrou-se de quando aquele grupo era muito maior. Tiraram uma foto com incontáveis rostos felizes. Aos poucos, alguns rostos foram mudando. Outros, simplesmente saíram. Os remanescentes pareciam felizes, ainda. Mas quando, numa festa, um desconhecido se propôs a tirar uma foto, alguém (todos e nenhum) respondeu:

– Não adianta tirar uma foto. Já passou.

Limitou-se a agarrar uma garrafa de cerveja vazia e deitar em seu colchonete. O suposto sono evitaria que notassem sua tristeza. A garrafa vazia justificaria o sono. Tudo muito bem arquitetado para pensar no que o entristecia, sem entristecer mais ninguém.

De olhos fechados, enumerou tudo o que a claridade o impedia de ver. E ah, eram tantos nomes diferentes para a mesma coisa! Sentia medo, angústia, ciúmes, cheiro de sal, dor de cabeça, perfume, prazer e, é claro, amor. Ele sentia o mundo. Tão amplo, tão intenso. E tudo aquilo era indissociável.

O que fazer quando, há anos, não se consegue mais chorar? Soltar um grito que incomode, quando nem ao menos se sabe se quer ser incomodado? Isolar-se e caminhar sozinho na praia, no bosque ou na cidade? Em qualquer parte, ainda estaria em si. E isso não podia ser evitado.

Ah, como eu fugi de mim...! Mas, agora, não adianta mais correr ou andar sozinho. Cheguei ao meu centro: a partir daqui, todas as distâncias são iguais, todos os nomes são para a mesma coisa. O centro não é exclusivamente ruim. Aqui eu me entendo. E entendo que é preciso entender os outros. E me enganar, sempre. Para compor a sucessão de enganos que culmina, há de culminar, em uma risada. Ser feliz é uma questão de opinião.

Em meio a tantos pensamentos, e devido aos olhos fechados, não notou a sombra estranha que a fogueira projetara na barraca. Foi uma passagem rápida; durou segundos. Mesmo que tivesse visto, teria dificuldades em acreditar no que vira. Talvez, chamasse de vulto. Ou culpasse a cerveja que não bebeu. Quando enfim se deu conta do que estava acontecendo, não conseguiu se mover. Paralisou-se de choque. Tudo o que fez foi contemplar os gritos de dor e desespero que vinham de fora, ainda de olhos fechados.



- A propósito, hoje faz 6 anos desde a minha primeira publicação em um blog. E, mesmo desleixados, ainda existimos. Parabéns pra nós! =)

2 comentários:

Renato Mendonça disse...

Was it just a dream? xD

Você escrevem muito bem, e admiro muito isso.
Quem dera eu poder um dia escrever com tanta maestria... =)

Ah, e parabéns pelo blog! ^^

Anônimo disse...

Me identifiquei muito.

Em pensar que encontrei este texto ao procurar por tautologia. rs

Se posso me intrometer, eu acharia o texto perfeito sem o último parágrafo. Ele é desnecessário =)

Abraços!

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